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Maya, ilusão e lila

Por Sri Chinmoy, do livro Meditação, Yoga e a Arte de Viver: a Aventura da Vida

Pergunta: Falando-se sobre o ensino, tenho tido dificuldade em explicar o conceito da doutrina hinduísta chamado de ‘maya’, principalmente no que concerne ao entendimento da vida como ‘ilusória’. Tenho problemas similares quando falo sobre o mundo como o ‘lila’ [o Teatro de Deus] e tento explicar a ‘falta de propósito’ do mundo criado por Deus como uma consequência de ser o Teatro Divino de Deus. Como posso melhor ensinar esses conceitos aos alunos nos Estados Unidos?

Sri Chinmoy: A doutrina hinduísta utiliza o termo ‘maya’, que significa ‘ilusão’. Desde o nascimento da religião hinduísta, tem sido uma crença que o mundo é uma ilusão. As personalidades espirituais do hinduísmo, os filósofos e alguns dos seus pensadores sentem um prazer enorme em dizer que o mundo nada mais é do que uma ilusão. Sua filosofia é: porque dar tanta atenção, ou qualquer atenção, a algo que é irreal?

Eu gostaria de dizer que é o cúmulo da nossa tolice dizer ou sentir que temos mais sabedoria ou entendimento que o Deus Transcendental e Universal. Estamos prontos para orar a Deus. Estamos prontos para nos dedicar à nossa ideia Dele. Mas não estamos prontos para aceitar a criação de Deus como algo real. Se acreditamos que estamos orando a um Deus que é real, então como podemos separar a realidade de Deus do próprio Deus?

‘Maya’ possui ainda outro significado, querendo dizer ‘efêmero, impermanente, temporário’. As coisas que vemos ou fazemos ou existem no mundo físico não durarão para sempre. Portanto, algumas pessoas descrevem o mundo físico como irreal. Mas a realidade exterior não precisa de imortalidade. Apesar de a realidade altíssima ser infinita, eterna e imortal, a realidade também pode ser breve, assim como o infinito pode ser infinitamente pequeno ou infinitamente vasto. A realidade pode ser breve e pode ser duradoura. A realidade pode ser imortal. Uma flor que dura apenas um dia não é irreal. Um ser humano que vive por 80 anos não é irreal. Eles são temporários; portanto, talvez você os descreva como ilusórios. Eles são reais, mas limitados, impermanentes.

 

Não importa o quanto tentemos definir Deus, não conseguiremos defini-lo. Definir é limitar, e Deus é ilimitado. Deus é a Criança da Eternidade, brincando no Jardim-Coração da sua própria Infinidade.

 

Alguns filósofos são da opinião que apenas o que dura para sempre é real. Mas se a Vontade de Deus é de criar algo que seja permanente ou algo que durará apenas pouco tempo, isso é uma escolha Dele. Ambas continuam sendo Suas criações. Ele é ao mesmo tempo o Criador e a criação, o Jogador e o jogo, o impessoal e o pessoal, o invisível e o visível, o conhecido e o incognoscível, o real e o irreal.

Não importa o quanto tentemos definir Deus, não conseguiremos. Definir é limitar, e Deus é ilimitado. Deus é a Criança da Eternidade, brincando no Jardim-Coração da sua própria Infinidade.

Assim como uma criança pequena sente uma imensa satisfação quando brinca com seus amigos, Deus a Criança-Jogadora gosta de brincar com Suas criações-amigas-crianças. Deus é um, mas Ele deseja experimentar-Se de maneiras incontáveis e formas incontáveis. E isso Ele faz através do seu Teatro Cósmico, do Seu ‘lila’. Você e eu e todos os seus alunos somos amigos-criações de Deus, apesar de não compreendermos o propósito da criação de Deus ou o nosso papel nela.

 

Pergunta: Qual deveria ser a atitude de uma pessoa com relação a coisas que fez antes, quando a mente mais elevada, que sabia que era errado fazer aquilo, não estava no controle? Qual deveria ser a nossa postura quanto à culpa que resulta dessas ações prévias?

Sri Chinmoy: A postura deve ser que o passado já se foi. Você fez algo errado. Se acalentar a ideia de culpa, “Fiz algo errado,” estará sendo sincero. Mas ficar pensando no seu erro, ter essa sinceridade, não ajudará. Mantendo uma consciência de culpa, você não obterá luz ou sabedoria. Se você fez algo que não está certo, agora tente fazer a coisa certa, a coisa divina. Esse segundo, esse minuto foi usado por você. Você poderia tê-lo usado para um propósito bom ou um propósito ruim. Tudo bem, você o usou para um propósito ruim. Então use o minuto seguinte para um propósito divino. Se usar para um propósito divino sem pensar no minuto anterior, quando fez algo errado, o que acontecerá? A sua força positiva, essa força de vontade que você usou para fazer a coisa certa terá todo o poder, toda a quantidade. Contudo, se pensar no minuto anterior com um sentimento de culpa, de que fez algo errado, e só então pensar que no minuto seguinte você fará a coisa certa, metade do seu poder se perderá de novo na escuridão, e apenas a outra metade poderá ser aplicada no minuto seguinte para a ação correta. Por isso eu digo aos meus discípulos que devem tentar trazer à tona seu poder integral no minuto seguinte e assim anular o erro anterior.

Ao ficar pensando ou acalentando ações ruins, a pessoa estará fortalecendo inconscientemente a sua culpa. Eu posso até pensar “Estou me arrependendo.” Mas por que eu deveria me arrepender? Eu fiz algo errado. Mas eu sou um herói. Estou preparado para sofrer as consequências. Se eu fiz algo errado, tenho a capacidade de fazer a coisa certa. Ao focarmos toda a atenção na coisa certa, estaremos aumentando a nossa força positiva.

O sentimento de culpa, o sentimento constante de autorreprovação é, infelizmente, todo-presente no mundo ocidental. Se a minha Fonte é Deus, a Luz Absoluta Infinita, se eu sei que é de lá que eu vim, então algum dia devo retornar à minha Fonte. Durante a minha permanência na Terra, infelizmente, tive algumas experiências destrutivas, não aspirantes e nada saudáveis. Agora tenho de me livrar dessas experiências infelizes. Tenho de ter experiências preenchedoras na minha vida. Para isso, devo me concentrar apenas na coisa certa, na coisa divina que me satisfará, e não nas coisas que se colocaram contra mim no meu caminho.