Livro Bhagavad Gita – capítulo 16 – As Divinas Forças e as Forças Não-Divinas
O mundo, o medo e as amarras compartilham da maior intimidade. Aquele que pensa em Deus é, por fim, amado pelo mundo. Aquele que ama Deus não teme. As amarras ele transcende.
Aquele que sente que os prazeres dos sentidos e a alegria suprema são a mesma coisa está completamente enganado. Auto-indulgência e a Meta da vida nunca podem e nunca caminharão juntas.
Para ver Deus, deve-se ser prático, absolutamente prático, tanto no mundo da realização quanto no mundo da manifestação. Ninguém pode ser mais prático do que aquele que é imbuído de qualidades espirituais. Sua vida é guiada, protegida e iluminada pelas forças divinas.
O medo teme permanecer com aquele que possui fé perfeita em Deus. Seu coração é pureza. Sua mente é liberdade. Duplicidade? Ele não sabe o que isso é. O seu amor ele utiliza para amar a humanidade. Ele só espera amor em retorno se tal for a Vontade de Deus. Seu serviço ele oferece ao Supremo na humanidade, tendo destruído completamente a raiz da árvore-expectativa – não, tentação – com o afiado machado da sua luz-sabedoria.
O deleite da devoção e o silêncio da meditação constantemente vivem nele. A violência é fraca demais para adentrar seu forte de pensamento, palavra e ação.
A mais pura sinceridade ele tem. O mais poderoso auto-sacrifício ele é.
Ele não veste uma coroa feita pelo homem, mas uma coroa feita por Deus, a qual o próprio Deus valoriza. O nome dessa coroa divina é humildade.
Aquele que é devorado pelas forças não-divinas não é apenas não-espiritual, mas também imprático no mais puro significado da palavra. Nunca ele pode ficar sozinho, mesmo que queira. A vaidade, a raiva, a ostentação e o ego o acordarão de seu sono e o compelirão a dançar com eles. Secretamente, mas rapidamente, a ignorância chega e junta-se à sua dança, prosseguindo, triunfante e alegre, a ensiná-los a dança da destruição.
Seu ego ele utiliza para comprar o mundo. Sua raiva ele utiliza para enfraquecer e punir o mundo. Sua vaidade e ostentação ele utiliza para conquistar o mundo. Conscientemente ele se oferece à glorificação dos prazeres dos sentidos. Ora, ele mesmo fracassa em contar seus projetos imaginários, pois são incontáveis, inúmeros. A coisa que ele tem como absolutamente sua é a auto-lisonja. E isso é o que ele infalivelmente é.
Ele diz à caridade e filantropia: “Vejam, estou enviando vocês duas ao mundo. Lembrem-se de que não estou lhes dando o mundo. Tragam de volta para mim fama e renome. Retornem em breve!”
A caridade e a filantropia humildemente ouvem a sua ordem. Elas correm em direção ao mundo. Elas tocam o mundo. Elas alimentam o mundo. Elas não esquecem de trazer fama e renome do mundo para o seu mestre. O mestre recebe seu cobiçado prêmio: fama e renome. Mas ora, para a sua maior surpresa, a futilidade segue sua fama e renome.
Sua vida é o hífen entre o pecado e o inferno. O que é o pecado? O pecado é o sabor da ignorância imperfeita. O que é o inferno? O inferno é a impiedosa tortura dos desejos insatisfeitos e o caloroso abraço da ignorância satisfeita.
Primeiro, o buscador deve encarar a ignorância e o conhecimento separadamente. Mais tarde, ele realiza que tanto na ignorância quanto no conhecimento ‘Aquilo’ existe. Aticemos nossa chama-aspiração com o devotado conhecimento do Isha Upanishad.
Avidyaya Mrityum Tirtha… (Isopanishad 11))
“Através da ignorância, ele cruza para além da morte; pelo conhecimento, ele desfruta da Imortalidade.”
O capítulo chega a um fim com a palavra shastras (escrituras) Os shastras não devem ser ridicularizados. Os shastras são as conquistas exteriores das experiências e realizações interiores dos visionários da Verdade. A meta suprema não é para aqueles que menosprezam as realizações e experiências espirituais dos visionários do passado venerável. Aqueles que sentem, por conta dos seus impulsos vitais, que podem praticar meditação e aprender os segredos da disciplina interior sozinhos estão cometendo um erro do tamanho dos Himalaias. Orientação pessoal é imperativa.
É fácil dizer: “Eu sigo meu próprio caminho.” Mais fácil ainda é se enganar. O mais fácil de tudo é matar de fome a divindade interior que tenta se revelar e manifestar.
O Professor ensina ao aluno: “Ó meu Arjuna, siga as shastras.” (cf 16.24)
A Tríplice Fé
O homem exterior é aquilo que a sua fé interior é. Todas as nossas atividades físicas, vitais e mentais possuem uma fonte comum. O nome dessa fonte é a fé. Com a nossa fé podemos criar, controlar, conquistar e transformar nosso destino. Em verdade, o que inconscientemente chamamos de fé humana nada é senão a vontade divina em nós e por nós.
O que um homem sáttvico faz com sua fé luminosa? Ele usa sua fé para invocar e adorar o Supremo. O que um homem rájasico faz com sua fé cheia de paixão? Ele a utiliza para adorar e satisfazer as divindades. O que um homem tamásico faz com sua fé tenebrosa? Ele adora os espíritos e fantasmas insatisfeitos, famintos, obscuros, impuros e terra-limitados.
Dizem que, no Ocidente, a comida pouco tem a ver com a fé. Na Índia, o elo entre o alimento e a fé é quase inseparável. Nossos videntes Upanishádicos declamaram: Annam Brahma – “O alimento é Brahman.” (Taittiriyopanishad III.2)
Um homem sáttvico ingere os alimentos que são frescos, puros e tranquilizantes, para que possa ter energia, saúde, alegria e uma vida longa.
Alimentos azedos, salgados e excessivamente apimentados são os preferidos de um homem rajásico. A doença o captura. A dor o tortura. Um homem tamásico também tem de comer, afinal. Ele come avidamente os alimentos que são velhos, sem gosto, impuros e repugnantes. O resultado da sua alimentação pode ser melhor sentido do que descrito.
Austeridade não quer dizer tortura física, longe disso. A mortificação da carne é algo de que apenas uma natureza diabólica poderia desfrutar. Deus, o Piedoso, não exige nossa tortura física. Ele quer que tenhamos a luz devotada da sabedoria, nada mais e nada menos.
Austeridade quer dizer um corpo dedicado, uma mente pura, um coração amoroso e uma alma desperta.
A austeridade exterior cresce no fértil solo da simplicidade, sinceridade e pureza. A austeridade interior cresce no fecundo solo da serenidade, tranquilidade e equanimidade.
A austeridade sáttvica não deseja recompensa. Ganhos, honra e fama são esperados e exigidos pela austeridade rajásica. Auto-imolação ou a destruição dos outros é o que a austeridade tamásica quer e valoriza.
Um buscador da Verdade transcendental e a forças-sexo nunca podem correr lado a lado. O buscador trilhando o caminho da auto-descoberta e Deus-descoberta deve conhecer o que é o verdadeiro celibato. Citando Krishnaprem:
“Um celibato neurótico, com a dita mente inconsciente repleta de sexo reprimido, gerando um caos de fantasia mais ou menos disfarçada, é a pior condição para alguém que busca a vida interior se encontrar. Tal condição pode, assim como uma fraqueza física extrema, causar estranhas experiências e visões, mas efetivamente prevenirá qualquer seguimento real no Caminho. O sexo será transcendido. Ele não pode ser suprimido… impunemente.”[1]
O capítulo encerra devotadamente com o Brahman. Brahman é divinamente designado pelas três palavras alma-comoventes: Aum tat sat. (17.23)
Aum é o supremo símbolo místico. Aum é o verdadeiro nome de Deus. O Aum está na manifestação cósmica. Além da manifestação, no mais longínquo além, está o Aum.
Tat significa ‘Aquilo’, o Eterno Inominável. Acima de todos os atributos, majestoso ‘Aquilo’ se sustenta.
Sat é a Realidade, a Verdade infinita.
Devemos entoar Aum e então começar a realizar os deveres divinos da nossa vida.
Devemos entoar Tat e então oferecer à humanidade todas as nossas conquistas energizadoras e preenchedoras.
Devemos entoar Sat e então oferecer a Deus o que interiormente e exteriormente somos, nossa própria existência.
[1] *Sri Krishna Prem, The Yoga of the Bhagavad Gita, London, 1951, p.173.
Livro Bhagavad Gita – capítulo 15 – O Supremo Purusha
O capítulo XII nos ensinou a verdade de que há um campo e há um Conhecedor desse campo. O capítulo XIV verteu abundante luz sobre o campo, o Jogo Cósmico da Prakriti. Neste capítulo particular, aprenderemos sobre o Conhecedor, o Eu Universal e o Eu Supremo.
Este capítulo começa com uma árvore. Essa árvore é chamada de árvore-mundo. Diferentemente das árvores terrenas ou botânicas, essa árvore tem raiz acima, no Supremo. O Supremo é a sua única Fonte. Seus ramos se espalham abaixo. Os Vedas são suas folhas. Aquele que envisionou as profundezas do mundo sempre-em-transformação e sempre-em-evolução possui todo o conhecimento védico a sua disposição.
Aqui na terra, essa árvore não é livre. Ela está presa por sua própria ação e reação neste nosso mundo. Ela é carinhosamente nutrida pelas três qualidades da Prakriti. Se alguém quer descobrir o início, o fim e a própria existência dessa árvore, é necessário livrar-se completamente dessa árvore-tentação.
Uma árvore significa aspiração. Essa aspiração por fim sobe ao Altíssimo. Incontáveis são os sadhus (monges) indianos que sentam-se debaixo das árvores e entram no mundo da meditação profunda. A aspiração da árvore os inspira e desperta sua aspiração dormente. O Senhor Buddha teve sua iluminação aos pés da Árvore-Bodhi. O mundo sabe disso.
O Gita é um oceano de espiritualidade. A filha mais carinhosa da espiritualidade é a poesia. O sutil alento da poesia é sempre acalentado pela vida-energizante espiritualidade. Identifiquemos nossa consciência com a consciência de uma poetisa, ao falar sobre a árvore.
Por tolas como eu, poemas podem-se escrever,
Mas uma árvore, apenas Deus pode fazer.
– Joyce Kilmer
Já que a poesia é o meu forte, tomo a liberdade de enxergar a realidade da mesma forma que a poetisa abençoada.
Retornemos à nossa árvore filosófica. Os sábios cortam suas raízes com o machado do desapego. Tal é o caminho para a libertação. Tal é o caminho para o bem supremo.
Um homem sábio vive em perfeito auto-controle. Ele é devotado sem reservas e incondicionalmente à Verdade. Ele quer Deus, e Deus somente, que é a Fonte do mundo interior e do mundo exterior, e também do mundo além. Os acontecimentos, encorajadores ou desencorajadores, agradáveis ou desagradáveis, divinos ou não-divinos, não agitam a sua mente, e muito menos a sua existência interior. Ele nada no mar de frutífero silêncio e equanimidade. Sendo mestre dos sentidos, ele é senhor deles. Ele vem até Krishna, sua única fortaleza. Não é necessário sol, lua ou chama em Sua Morada. Essa Morada é a Fonte do universo inteiro. Ela é toda Iluminação. De Sua Morada eterna, não há retorno.
Não é para os desiludidos, mas para os buscadores imbuídos com a visão divina, saber reconhecer ou compreendê-Lo, o Senhor Supremo, que entra no corpo, reside no corpo e vivencia as realidades da Natureza, deixando o corpo à Sua Hora escolhida.
Certamente, todos os esforços sinceros de um homem serão em vão, a não ser e até que sua natureza esteja a seu comando, até que seu coração transborde com amor e devoção ao seu Professor espiritual (Guru), até que ele sirva o Alento vivente do Senhor na humanidade.
Há duas facetas da criação: a perecível e a imperecível. Além dessas duas está o Supremo Impessoal. Esse Supremo Impessoal é, ao mesmo tempo, tudo-permeante e tudo-sustentador.
O Senhor diz: “Eu, o Purushottama, o Supremo Senhor, transcendo tanto o perecível quanto o imperecível.” (15.18)
Há quatro Vedas. Todos os quatro Vedas falam significativamente sobre esse Ser Supremo.
O Ser Supremo, de mil cabeças, mil olhos, mil pés;
Ele permeia a extensão da terra;
Ele está além de todos os dez cantos.
(Rigveda X.90.1-2)
Aqui ‘mil’ certamente significa infinitos. A infinidade manifesta-se através do finito no campo da manifestação.
Purushottama está além de forma e sem-forma, além de impessoalidade e personalidade. Nele, o mais poderoso anseio dinâmico e o mais profundo Silêncio habitam juntos. Para Ele, tratam-se da mesma coisa. Para Ele, são iguais liberdade celestial e necessidade terrena, a sempre-mutante forma da terra e a imutável Realidade infinita.
Livro Bhagavad Gita – capítulo 14 – Os Três Gunas – Sattva, Rajas e Tamas
Sattva é pureza. Sattva é luz. Sattva é sabedoria. Felicidade e sattva ficam juntos. Harmonia e sattva respiram juntos. Os sentidos em sattva estão sobrecarregados com a luz do conhecimento. Se alguém deixa o corpo quando sattva prevalece, para a pura morada dos sábios ele vai.
Rajas é paixão. Rajas é desejo. Rajas é atividade não-iluminada. Rajas prende o corpo à ação. Rajas permanece com o dinamismo inflexível ou com a agressão cega. Inquietação e Rajas respiram juntas. Separar a labuta do rajas é praticamente impossível. Rajas é outro nome para o movimento tomado de paixão. Se alguém morre quando rajas prevalece, ele renasce entre aqueles apegados à ação.
Tamas é sono. Tamas é escuridão. Tamas é ignorância. Estagnação e tamas permanecem juntos. Futilidade e tamas respiram juntos. É impossível para o tamas ser separado das dores impiedosas. Tamas é um outro nome para a morte lenta. A morte em tamas é seguida por renascimento entre os tolos insensatos.
A árvore-sattva dá o fruto chamado harmonia.
A árvore-rajas dá o fruto chamado dor.
A árvore-tamas dá o fruto chamado ignorância.
Sattva oferece ao mundo inteiro um conhecimento luminoso; Rajas oferece ambição apaixonada; Tamas oferece ilusão completa. Aquele cuja vida está inundada de sattva olha acima, para o céu. Portanto, ele vai às esferas mais elevadas. Aquele cuja vida está acesa com rajas olha arrogantemente para o mundo. Portanto, é justamente ali onde ele vive. Cego é aquele cuja vida está coberta de tenebroso tamas. Ele é cego como uma pedra. Portanto, ele afunda.
O Senhor diz que aquele que compreende a origem da ação nessas triplas qualidades de Prakriti e, ao mesmo tempo, compreende Purusha, que está além das qualidades, alcança o Senhor e adentra a Sua Natureza. E finalmente, quando vai além do domínio dessas três qualidades – sattva, rajas e tamas –, ele bebe profusamente o Néctar de Imortalidade. (14.19-20)
Faça todo o bem que puder,
Com todos os meios que puder,
De todas as maneiras que puder,
Em todos os lugares que puder,
A toda hora que puder,
A todas as pessoas que puder,
Por quanto tempo puder.
– John Wesley
Precisamente isso é esperado do homem sáttvico. Agora, você pergunta, como é que também ele deve transcender a sua natureza? Ele não é singular em seu serviço à humanidade? Ele pode ser singular em sua grande família humana, mas ainda tem de alcançar a liberdade perfeita. Silenciosamente, secretamente e, ora, por vezes até mesmo inconscientemente, o pobre homem sáttvico é apegado aos frutos de seu generoso serviço, aos efeitos de seu sublime conhecimento. Assim, com vistas em alcançar absoluta sabedoria e perfeita perfeição, o homem sáttvico deve transformar e transcender sua natureza.
Após ter transcendido os três gunas, é necessário fazer uma escolha: se deseja permanecer no Transcendente, muito acima do campo da manifestação, ou se deseja servir o eterno Alento do Infinito na humanidade e inspirar a humanidade à realização do supremo deleite, paz e poder.
Não uma, não duas, mas três perguntas relevantes Arjuna faz. Quais são as marcas daquele que transcendeu as três qualidades? Como ele se comporta? Como ele vai além das três qualidades? (14.21)
As respostas de Krishna são:
O Yogi que transcendeu as três qualidades em sua própria vida não detestará e nem buscará os frutos de sattva, rajas e tamas. Dentro e fora ele é inundado com a equanimidade da alma. Ele é absolutamente independente. Ele realizou a absoluta independência de sua divindade interior. Algo mais: ele serve Deus com sua devoção reluzente. Ele o faz devotadamente. Ele serve a humanidade com todo o seu amor. Ele o faz incondicionalmente. Ele vê Deus e Deus apenas em todas as almas humanas. Tal yogi por fim se torna, sem falta, o Eu Supremo. (14.22-26)
Livro Bhagavad Gita – capítulo 13 – O Campo e o Conhecedor do Campo
Devoção é mais do que suficiente para realizar o Senhor Krishna, a Verdade Eterna. No entanto, neste capítulo, Sri Krishna quer ampliar o conhecimento de Arjuna, de maneira filosófica e intelectual. Aqueles que acalentam perguntas filosóficas e intelectuais sobre a Verdade serão agora verdadeiramente satisfeitos.
Tentamos evitar e ignorar aquilo que cria problemas em nossa vida. De acordo com Krishna, essa dita sabedoria nada é, salvo ignorância. É verdade que não tentaremos criar problemas nós mesmos. Mas, se os problemas aparecem, então temos de encará-los, entrar neles e, finalmente, conquistá-los de forma corajosa e completa.
Arjuna já foi abençoado pelo Senhor com as altitudes interiores. Agora o Senhor quer iluminá-lo com o conhecimento do cosmos, onde ele deve ter um papel consciente.
Matéria e espírito. Prakriti e Purusha. O campo e o conhecedor do campo. O corpo é o campo. A alma é o seu conhecedor. A verdadeira sabedoria reside em realizar o Supremo Conhecedor e o cosmos conhecido e revelado.
Existem vinte e quatro tattvas, princípios, que constituem o campo. O primeiro grupo de grandes elementos ou bases é: terra, água, fogo, ar e éter. O campo também abriga o ego e a mente terra-limitada, o intelecto, os cinco órgãos de ação – mãos, pés, língua e os dois órgãos de excreção –, e também os órgãos dos sentidos, como o nariz, boca, olhos, ouvidos, etc. As cinco esferas dos sentidos são a visão, o olfato, o paladar, a audição e o tato.
Apenas uma coisa deve ser conhecida. Saber que o Senhor está dentro do cosmos, fora do cosmos e além do cosmos é saber tudo.
Matéria e Espírito (Prakriti e Purusha) não têm início. A matéria é a substância primordial. A matéria é sempre mutante. O Espírito é sempre estático. A matéria é possuidora de infinitas qualidades. O Espírito vê e sanciona. A matéria faz, cresce e se torna. O Espírito é consciência. O Espírito é a testemunha. A matéria é a criatividade infinita. O Espírito é a Realidade no homem. O Espírito é o percebedor da matéria. Aquele que realizou o eterno silêncio do Espírito e a dança cósmica da matéria pode agir em qualquer âmbito da vida, seja como médico ou filósofo, poeta ou cantor. Ele alcançou a perfeição da realização suprema. Alguns realizam o Supremo Espírito na meditação. Outros realizam pelo conhecimento (a filosofia Sankhya). Há ainda outros que realizam o Supremo Espírito pelo yoga da ação e serviço abnegado. Em adição, há aqueles que não estão cientes, mas ouviram sobre o Supremo Espírito de outros e começaram a adorá-Lo em devoção, também aderindo firmemente à Verdade. Eles vão além da mortalidade e transpõem as armadilhas da morte.
O Espírito está na matéria. Ele degusta as qualidades nascidas da matéria. Ele experimenta a existência física. As qualidades adquiridas determinam o seu renascimento. O Espírito é o Próprio Supremo. Apesar de Mestre do corpo, ele passa pela vida mortal.
O caminho até Deus é enxergar a Vida Eterna na vida efêmera; saber que a Prakriti, e não o Purusha, é apegado à ação. Todas as atividades, diz o Gita, divinas e não-divinas, nascem na Prakriti. O Purusha é imóvel. Nenhuma ação é possível no Purusha, pois ele transcende ambos tempo e espaço. Ainda assim, sem o Purusha, não pode haver universo, não pode haver manifestação.
Conhecer que Purusha e Prakriti são um só e inseparáveis é conhecer a Verdade, a Verdade da unidade e divindade na humanidade, que irá por fim ser manifestada como a divindade da humanidade.
O Gita não abriga metafísica lógica, árida. Seus ensinamentos não precisam de qualquer apoio dos argumentos intelectuais. A razão humana não pode bater à porta da Realidade Transcendental, nunca. O que é o Gita, senão a Realidade Transcendental supremamente e divinamente incorporada?
Cada ser humano tem de aprender cinco segredos supremos com o Gita:
Veja a Verdade.
Sinta a Verdade.
Seja a Verdade.
Revele a Verdade.
Manifeste a Verdade.
Neste capítulo observamos que o Gita é, ao mesmo tempo, o significado da vida e a interpretação divina da vida. Infelizmente, este capítulo em particular tornou-se vítima de feroz contradição, apesar do fato de que o Gita, do início ao fim de sua jornada, não vê o rosto da contradição. O Gita vê e revela apenas a face da Verdade em sua unidade na multiplicidade. Estudiosos e comentaristas estão em guerra em suas teorias. Nem mesmo os filósofos estão inclinados a evitar essa batalha. Cada um está inspirado a impor suas sublimes teorias sobre os outros. Mas um buscador genuíno da Suprema Verdade é realmente sábio. Ele ora para o Senhor Krishna para que o Gita seja sua experiência pessoal. Sri Krishna sorri. O devoto declama:
Tu, que tens me dado tanto,
Dê-me uma coisa mais, um coração grato.
Não um coração agradecido quando eu quiser,
Como se as Tuas Bênçãos tivessem dias de folga,
Mas um coração tal cujas batidas possam ser
Tua adoração.
– George Herbert
Vejam! O devoto venceu a corrida! O devoto precisa de um Guru, um Mestre. Sri Krishna é o Guru, e Arjuna é o discípulo. Um eminente erudito indiano, Hari Prasad Shastri, escreve:
É o Guru, ou Mestre, uma necessidade absoluta para a realização da Verdade? A resposta, de acordo com o Gita, é “Sim”. O Guru é a pessoa que ensina a unidade da alma com o Absoluto e vive a vida de Sattva. Ele pode ser de qualquer um dos dois sexos e, de acordo com o Gita, não precisa ser um recluso, vivendo nas neves do Himalaia, afastado do mundo, falando apenas através de apóstolos escolhidos e enviando cartas fantásticas através do ‘correio astral.’ O Guru do Gita é um homem como qualquer outro bom homem, que todos podem ver em horários convenientes, que vive na sociedade e não clama superioridade sobre outros.
Finalmente, o Gita nos conta que o Guru de todos os gurus, o verdadeiro Guru, é Deus.
Livro Bhagavad Gita – capítulo 12 – O Caminho da Devoção
Arjuna está extremamente feliz e é muito afortunado, pois ele teve a mais rara visão da Forma Cósmica. Como é possível para ele ainda estar carregado com perguntas filosóficas e espirituais? O motivo para tanto é que sua visão da Forma Cósmica não implica que ele alcançou a Meta das metas. A visão deve ser transformada em uma realidade viva, constante, na vida de Arjuna, e ele também precisa viver na própria realidade. A experiência da visão é boa. A realização da visão é melhor. A incorporação da visão é o melhor de tudo. Melhor do que o melhor de tudo é a revelação da visão. Finalmente, a manifestação da visão é supremamente e divinamente inigualável.
O caminho da meditação e o caminho da devoção são agora comparados. Arjuna deseja saber de Krishna sobre os dois caminhos – o caminho da meditação, que leva ao Imanifesto, e o caminho da devoção, que leva ao Deus pessoal. Qual é o melhor dos dois? A resposta de Krishna é que cada caminho, quando seguido fiel e devotadamente, leva à Meta. Mas o caminho da meditação é mais difícil e mais árduo. O corpo físico nos amarra ao mundo material. Por isso, é difícil meditarmos no Impensável, no Inimaginável e no Transcendental. Mas, se abordamos o Senhor que assume a forma humana e toma parte em Seu jogo divino no campo da Sua manifestação, nosso sucesso será indubitavelmente mais fácil, mais rápido e mais convincente, em quantidade tal que nossas mentes físicas não acreditariam ser possível.
Um buscador genuíno deve dissolver tudo o que tem – ignorância e conhecimento – e tudo o que ele é – ego e aspiração – em Deus. Certamente é muito difícil, mas não é impossível. Vejam! A ele é dada a oportunidade dourada de aceitar o mais fácil e mais efetivo caminho. Nesse caminho único, ele apenas tem de oferecer os frutos da ação ao Senhor e tem de dedicar-se – corpo, mente, coração e alma – ao Senhor.
O caminho da meditação e o caminho da devoção levarão por fim à mesma Meta. Mas o que faz com que o aspirante sinta que o caminho da meditação é extremamente difícil de seguir? A resposta é muito simples. O aspirante não pode focar a atenção da sua mente no Além Imanifesto. Mas se o aspirante é devotado ao Senhor em Sua criação manifestada, e se ele deseja enxergar e adorar o seu Amado em cada coisa, seu caminho passa a ficar certamente mais fácil. Primeiro, adore a forma. Então, a partir da forma, vá ao além Sem Forma. No início, o discípulo deve abordar o aspecto divinamente humano do Guru e, então, ele deve ir além, muito além da forma física e substância física do Guru, para comungar com e permanecer no Além indescritível e sempre-transcendente.
O discípulo quer o caminho mais fácil. Sri Krishna graciosamente concorda. Ele diz que o caminho da meditação é difícil, que o caminho do serviço altruísta é difícil e que o caminho inspirado pelo Amor e Devoção é difícil. Mas há ainda um outro caminho, que é extremamente fácil de seguir. Nesse caminho, deve-se apenas renunciar o fruto da ação. Se não podemos realizar o nosso trabalho como um serviço dedicado a Deus, não devemos sucumbir ao negro desapontamento. Podemos simplesmente agir, agir por nós mesmos. Só precisamos oferecer nossos frutos ao Senhor. No entanto, nos sairemos bem se fizermos apenas aquele trabalho que sentimos interiormente como correto. Naturalmente, faremos o trabalho o qual nos é exigido por nosso dever devotado. Se fizermos nosso dever devotado e oferecermos os frutos ao Senhor, em pouco tempo conquistaremos o nosso Piloto Interior.
Livro Bhagavad Gita – capítulo 11 – A Visão da Forma Universal e a Manifestação Cósmica do Senhor
Em sua infinita Generosidade, ilimitado Amor e profundíssimo e devotado Cuidado, Sri Krishna desvelou o segredo supremo de que Ele está em tudo e Ele incorpora tudo. A eminente desilusão gitde Arjuna foi removida e dispersa. Ele agora desfruta da paz translúcida de sua alma.
Sri Krishna fala com a abundância do Seu amor. Arjuna ouve com a mais sublime devoção do seu coração, e acredita Nele sem reservas e devotadamente. O credo singular de Arjuna clama por sua transformação; sua aspiração chora por uma experiência. Sua mente compreende a verdade, mas seu coração anseia pela visão da verdade e por viver a Verdade. Por isso, ele necessita dessa experiência inescapável e inevitável. Sri Krishna graciosa e imediatamente a confere, a Experiência Sem Par.
“Ó Arjuna, observe em Meu corpo o universo inteiro.” (11.7) Os olhos físicos de Arjuna naturalmente falham em enxergá-lo. O Senhor o concede o olho de visão superna, o olho que enxerga o invisível – o olho yogi.
O corpo do qual o Senhor fala é o corpo espiritual. Portanto, para ver o corpo espiritual, Arjuna precisa que lhe seja concedido um olho espiritual. O corpo significa forma. O sem-forma reside nessa forma. A Visão Transcendental e a Realidade Absoluta brincam em unicidade, em e através da forma cósmica. O corpo de carne e osso passa por diversas vicissitudes, mas não o corpo de forma ilimitada, divina forma e substância imorredoura. Esse corpo divino é a encarnação e revelação da Divindade, Infinidade, Eternidade e Imortalidade da Verdade.
Sanjaya diz a Dhritarashtra: “Ó rei, Krishna, o Mestre supremo de Yoga, o Senhor Todo-Poderoso, revela a Arjuna Sua Forma divina, suprema. Arjuna agora vê Krishna como a Divindade Suprema, Parameshwara.” (11.9)
Arjuna vê a multiplicidade no Uno Supremo, possuindo uma miríade de bocas, inúmeros olhos, ilimitadas maravilhas, empunhando armas divinas, vestindo jóias e roupas divinas, usando guirlandas celestiais de fragrância superna. A efulgência de mil sóis irradiando ao mesmo tempo nos céus não se equiparam ao esplendor supremo do Senhor. Arjuna observa na pessoa divina de Krishna a Infinidade na multiplicidade. Sobrepujado, com êxtase inundando seu interior mais profundo, de mãos postas e cabeça baixa, ele exclama: “Ó Senhor, em Ti, em Teu Corpo, vejo todos os deuses e todos os níveis de seres, com marcas distintivas. Vejo até mesmo Brahma, sentado, resplandecente em Seu Trono-Lótus, com sábios por toda a parte e serpentes simbólicas – todas divinas.” (11.15)
Quando nos elevamos com a puríssima e ardente aspiração, entramos na consciência cósmica dos sábios. Esse é um caminho que leva ao alto. É o caminho da encarnação e realização. Há outro caminho, conhecido como o caminho da revelação e manifestação. Esse é o caminho que leva abaixo. Aqui, a nossa consciência flui no sentido descendente, através da energia cósmica, as serpentes simbólicas, circulando e espiralando.
Os versos 15 a 31 eloquentemente e psiquicamente descrevem o que Arjuna viu em Krishna com sua recém-adquirida visão Yogi. A luta ainda está por começar. Os poderosos guerreiros estão prontos e ávidos para lutar. Para sua maior surpresa, Arjuna vê a completa extinção das vidas dos guerreiros em Krishna. Antes do início da luta, ele vê a morte dos guerreiros. Estão destruídos. Quando ele vê as chamas da boca flamejante e tudo-devoradora de Krishna, seu próprio alento-vida estremece. O discípulo chama: “Tua compaixão, meu Senhor Supremo, eu imploro. Não conheço-Te. Quem és Tu?” (11.31)
“O Tempo é o que sou. Tempo, o poderoso destruidor, é o que sou. Eles estão destinados. Quer você lute ou não, eles já estão mortos. Mesmo sem você, seus inimigos não escaparão da morte. Erga-se, Ó Arjuna, erga-se. Adquira a glória e renome da vitória, conquiste seus inimigos. Desfrute do vasto reino, desfrute. Foi por mim ordenado o silêncio das suas vidas. Seja você a causa exterior. Seja apenas o meu instrumento, nada mais.” (11.32-33) Nimittamatram Bhava. “Seja um mero instrumento.” (11.33b)
Não pode haver maior orgulho, melhor conquista, do que ser o instrumento de Deus, pois ser um instrumento de Deus é ser infalivelmente aceito como parte Dele. Em e através do discípulo-instrumento, o Guru-Mestre enxerga e satisfaz o Propósito divino de Deus.
Krishna é o tempo tudo-devorador. Essa visão, de acordo com nossos olhos e compreensão exteriores, é terrível. Mas, de acordo com nossa visão interior e compreensão interior, ela é natural e inevitável. Sri Aurobindo escreve:
O Tempo se representa ao esforço humano como um amigo ou um inimigo, uma resistência, um meio ou um instrumento, mas ele realmente é sempre o instrumento da alma. O Tempo é um campo de circunstâncias e forças, encontrando-se e criando uma progressão resultante, cujo curso ele mede. Para o ego, é um tirano ou uma resistência; para o Divino, um instrumento. Portanto, enquanto o nosso esforço é pessoal, o Tempo parece ser uma resistência, pois ele traz toda a obstrução das forças que são conflitantes com as nossas próprias forças. Quando a ação divina e a ação pessoal são combinadas em nossa consciência, ele aparece como um meio e condição. Quando as duas se tornam uma, ele aparece como um servo e instrumento.[1]
Krishnaprem, o grande buscador, disse:
É impossível descrever em palavras essa maravilhosa visão. Todas as coisas continuam as mesmas, mas, ainda assim, estão mudadas. O Tempo reluz corporeamente na Eternidade; o Fluxo corrente é, em si próprio, o Eterno, o Eterno que, apesar de mover-se incessantemente, não se move.[2]
O conhecimento dos Upanishades ecoa e reecoa em nossos corações aspirantes: “Aquilo se move e, ainda assim, Aquilo não se move. Aquilo está longe e, ainda assim, Aquilo está próximo…” (Isopanishad 5)
O Tempo abriga a Verdade. Sri Krishna diz a Verdade, a Verdade Eterna, sobre Si próprio. Agora podemos lembrar das palavras significativas de Virginia Woolf: “Se você não disser a verdade sobre si mesmo, não poderá dizer a verdade sobre outras pessoas.” Reciprocamente, se você conhece a verdade espiritual sobre si mesmo, deve conhecer a verdade sobre os outros. Sri Krishna mostrou a Verdade divina que era Ele próprio.
Podemos alegremente caminhar com Marcus Aurelius: “Não consigo compreender como qualquer homem possa querer qualquer coisa senão a Verdade.”
Duvidar do Mestre espiritual antes de alcançarmos a iluminação não é incomum na história espiritual do mundo. Mesmo alguns dos mais queridos discípulos dos grandes Mestres espirituais passaram por isso. Mas se o buscador deixa o Mestre justamente porque a dúvida o assombra, isso é um ato de completa tolice. Segure-se, segure-se e não largue até o fim. As dúvidas daninhas desaparecerão como se nunca tivessem existido. O esplendor da Infinidade e Eternidade florescerá no regaço do Tempo. A sua aspiração ascendente realizará esse feito.
A voz soluçante de Arjuna profere: “Tu és a Alma primeva…” (11.38a) Ele chora pelo perdão de Krishna. Por conta de sua ignorância do passado, ele não reconheceu Krishna em Sua natureza divina. Seu passado estava repleto de ações incorretas, parte por conta da ignorância, parte por conta de falta de cuidado. Ele implora, com um coração que soluça, por perdão pelos seus atos de omissão e crimes cometidos contra Krishna.
“Tolere-me, assim como um pai tolera o filho, como o amigo, o seu amigo, como o amante, a amada.” (11.44a) Sri Krishna sem dúvidas perdoa Arjuna. Ele retorna à sua forma normal, natural e familiar.
Arjuna descobre que é a Graça Divina que lhe concedeu o olho yogi para ver o Não-visto, a Glória Suprema do Senhor, o presente, o passado e o futuro.
Ele também aprende com o Senhor que “nem o estudo dos Vedas, nem o sacrifício, nem a esmola, nem a austeridade e nem escolaridade podem obter essa visão cósmica…” (11.53) Mesmo os deuses anseiam por um vislumbre dessa Forma Universal que Krishna mostrou a Arjuna, em Sua ilimitada Compaixão.
Fé, devoção, entrega. Vejam! Krishna é conquistado. Não há outra maneira para realizá-Lo ou possuí-Lo.
[1] * Sri Aurobindo, The Synthesis of Yoga, 4th ed., Pondicherry, 1970, p. 61f.
[2] * Sri Krishna Prem, The Yoga of the Bhagavad Gita, London, 1951, p. 107.
Livro Bhagavad Gita – capítulo 10 – A Perfeição Divina e Universal
O que existe dentro de nós é perfeição. O que existe fora de nós é imperfeição. O mundo exterior pode ter perfeição apenas quando o mundo interior inspira, guia, molda e dá forma ao mundo exterior.
O ontem sonhou que o hoje seria a perfeição. O hoje sonha que o amanhã será a perfeição. A perfeição já alcançada desvanece numa insignificante imperfeição diante do nascimento do futuro vindouro.
A perfeição cresce. Ela tem agido assim desde o início da criação. Diferente de nós, Deus possui um Sonho: a perfeita Perfeição. Essa perfeita Perfeição deve reluzir nos corações aspirantes da individualidade e universalidade, para que a Realidade absoluta possa ser a completa expressão da Visão Cósmica.
Todos são queridos para Deus. Mas a mais doce e mais íntima relação existe apenas entre um devoto e o Senhor. Um verdadeiro devoto adora o Senhor sem a preocupação dos desejos. O Senhor o abençoa, não apenas sem reservas, mas também incondicionalmente. O que um devoto precisa é da força determinada do seu coração. Uma vez encontrada, sua auto-realização não permanecerá distante.
Compreender a verdade é uma coisa. Acreditar nela é outra coisa. Não compreender a verdade não é um crime – longe disso. Mas não acreditar na verdade não é menos do que um pecado imperdoável. Uma criança não compreende a vasta sabedoria de seu pai. Apesar disso, a fé que possui na sabedoria de seu pai é espontânea e genuína.
Sri Krishna é a sabedoria absoluta. Ele é a glória suprema. Ninguém compreende a sua glória, nem mesmo os deuses. Arjuna pode não compreender Krishna, mas sua fé implícita em Krishna fala por ele: “Ó Krishna, Tu és o Senhor dos Senhores. Supremo Tu és. Nisso eu acredito. Nem os deuses e nem os demônios compreendem tuas misteriosas manifestações. A fonte de todos os seres Tu és. Tu és conhecido por Ti somente.” (10.12-15)
Se a coisa acreditada é incrível, também é incrível que o incrível seja assim acreditado. – São Agostinho
Acreditar é a completa liberdade da mente. Acredidar é a plena independência do coração.
Krishna torna claro a Arjuna que sua glória divina pode ser elucidada e demonstrada, mas nunca exaurida. O Universo em sua totalidade é apenas uma pequena centelha de sua infinita magnitude.
Pandavam Dhananjaya, diz Krishna. “Dentre os Pandavas, eu sou Dhananjaya.” (10.37) Dhananjaya é um cognome de Arjuna. Cada pessoa possui um corpo, uma mente, um coração e uma alma. Como pode alguém que está diante de outra pessoa dizer que é a outra pessoa? Não parece absurdo? Só parece absurdo quando vivemos no físico, e não quando vivemos na unicidade do Espírito. Quando declaramos que todos os seres humanos são iguais, apenas descrevemos um fato simples, no qual acreditamos interiormente ou tentamos acreditar. É o sentimento de identificação que nos faz sentirmos um. Krishna diz: “Eu sou isto, Eu sou aquilo, Eu sou tudo.” E Ele ainda diz que Ele é o melhor, mais elevado e mais poderoso em tudo. Isso significa que Sua Consciência está manchada de parcialidade? Ele discrimina? Não. Ele é imparcial, Ele não discrimina. “Arjuna, sou o ‘Eu’ entronado no coração de todos os seres. Sou o princípio, o meio e o fim de todos os seres.” (10.20)
Ele quer iluminar a mente de Arjuna ao dizer que, no processo de evolução cósmica, Ele revela e manifesta a Sua própria perfeição. Suas manifestações divinas são infinitas. Ele mencionou apenas algumas, como exemplo. Dele nascem a permanência, bondade e força. Ele diz a Arjuna que este não precisa conhecer Suas manifestações divinas em detalhe. Isso simplesmente confundirá a sua mente. “Eu criei o universo todo com uma porção de Mim.” (10.42) Sabendo disso, o buscador em Arjuna pode facilmente satisfazer a sua fome.
“Sou a semente de todas as coisas, animadas e inanimadas.” (10.39) Arjuna agora realiza que Krishna não é meramente o corpo. Ele é o Eu tudo-permeante. Arjuna deseja saber sob qual forma particular o Eu deve ser adorado. “Sob todas as formas,” é a resposta imediata de Krishna. Nada existe sem o Eu. O Eu está em tudo, e tudo está no Eu. Essa é a sabedoria que o conhecimento do buscador deve possuir.
O Gita nos ensina a mais pura unicidade. Essa unicidade é a unicidade interior. Essa unicidade interior é, ao mesmo tempo, espontânea e única. Essa unicidade nunca pode ser mutilada ou reduzida pela mente. O reino de unicidade está muito além do alcance da mente física.
Auto-conhecimento é o conhecimento da unicidade universal. A perfeição divina pode ser fundada apenas no fértil solo da unicidade universal. Sirva a humanidade, precisamente porque a Divindade é evidente dentro da humanidade. Conheça a Divindade, e você logo realizará a Imortalidade de Deus em si, e a sua Imortalidade em Deus. Apenas Deus no homem e o homem em Deus podem anunciar as mais genuínas encarnações da perfeita Perfeição.
Livro Bhagavad Gita – capítulo 9 – O Segredo Supremo
O segredo supremo é o Conhecimento supremo. Ele não pode ser explicado. Ele deve ser realizado. Esse supremo Segredo está escrito em letras douradas nos mais profundos recônditos de cada coração divinamente humano. Ele não rejeita ninguém, nem mesmo aquele que está afogado em pecados. Aquele que não possui fé no que Krishna diz não terá saída das amarras da ignorância. Ter fé é ter uma medida de boa sorte singular. Assim como a devoção exemplar, a fé também precisa de um Deus pessoal, e ela tem um. A fé não é uma crença cega. A fé não é uma entrega cega, indefesa, aos livros sagrados. A fé é a percepção consciente da nossa liberdade ilimitada.
Krishna diz: “Ó Arjuna, a salvação não é para aquele que não possui fé. Ele está preso para sempre às tristezas da vida e às dores da morte.” (9.3) Aquele que trilha a estrada da fé verá por si mesmo a Verdade suprema aqui na terra. A determinação do coração aspirante do buscador é a sua fé mística. A convicção da reveladora alma do buscador é a sua fé triunfante. Um homem comum, não aspirante, é colocado a flutuar pelos mundos de falsas esperanças. Mas um homem de fé sempre vive nos mundos de forte afirmação. Completamente alegre e sem reservas, ele lança mais e mais combustível de fé reluzente no Altar de Deus. É desnecessário dizer que o florescimento de sua alma corre a passos largos.
Com um sorriso, Krishna diz: “Os desiludidos fazem pouco caso de Mim, das minhas encarnações humanas, não sabendo que Eu sou o Senhor Supremo de todas as coisas.” (9.11)
Reconhecer um Avatar não é uma tarefa fácil. É necessário ser abençoado pelo próprio Avatar ou possuir o dom da visão interior. Um aspirante deve se preparar para ser capaz de reconhecer um Avatar. Ele deve evitar os prazeres dos sentidos. Ele não pode ser controlado pelas paixões. É ele quem deve controlar suas paixões. Ele deve inspirar sempre o alento da pureza. O medo ele deve partir ao meio. A dúvida ele deve vencer. A paz ele deve invocar. A alegria ele deve beber.
Realizar cerimônias e ritos abstrusos não é necessário. A auto-doação é a única coisa necessária. Deus aceita tudo com a maior alegria. Podemos começar nossa jornada interior oferecendo a Ele folhas, flores e frutos. Mesmo o menor ato de oferecimento a Deus é um passo dos mais genuínos no caminho da auto-descoberta e Deus-descoberta. Nós pensamos. Se oferecermos nosso ‘pensar’ a Deus, esse próprio ato de oferecimento dos pensamentos nos fará por fim um com Deus, o Pensamento. Um homem comum sente que ele pensa apenas porque vive. Mas Descartes possui uma visão completamente diferente: “Penso, logo existo.” Esse “existo” não é apenas o fruto da criação, mas também o seu alento. São significantes as palavras de Bertrand Russell: “Os homens temem os pensamentos mais do que qualquer outra coisa na terra – mais do que a ruína, mais do que até mesmo a morte.”
Se pudermos descobrir um pensamento verdadeiro, divino, no mesmo momento Deus irá pedir ou obrigar o tempo a ficar do nosso lado. Com a exceção do tempo, nada pode nos ajudar a sentir o alento da Verdade e tocar os pés de Deus. Podemos possuir o tempo da Eternidade se realmente quisermos. São doces e cheias de significado as palavras de Austin Dobson: “O tempo se vai, você diz? Ah, não! O Tempo fica; nós vamos!”
Nós servimos. Se servimos a Ele, a Ele apenas, na humanidade, nos tornamos um com Sua Realidade absoluta e Sua Unicidade universal. Não podemos esquecer que nosso serviço dedicado deve ser oferecido com uma enxurrada do mais puro entusiasmo. O verso 29 é muito familiar e conhecido. “Para Mim, todos são iguais. Não sei favorecer; não sei desfavorecer. Meus devotos amorosos e que me adoram estão em mim; também eu estou neles.” (9.29) Essa é uma experiência que se destaca, como um resgate corajoso, na vida de um buscador verdadeiro. Não há privilégio especial. A todos é dada a mesma oportunidade. É desnecessário dizer que um verdadeiro devoto já passou por intensas disciplinas espirituais. Se ele agora se torna um devoto genuíno e passa a ser querido e próximo de Krishna, deve-se compreender que ele está tendo o resultado de suas disciplinas férreas e severas austeridades do passado. Sem dor, não há resultado. Sem sinceridade, não há sucesso. Tenha aspiração. Ela acelerará o seu progresso interior e exterior.
O devoto aspira. Sri Krishna reside em sua aspiração. O devoto realiza. Em sua relização, ele descobre que Krishna é o seu eterno alento. Um devoto nunca está sozinho. Ele descobriu a verdadeira Verdade – que o seu sacrifício o une com seu Senhor. Quanto mais ele se oferece conscientemente ao Senhor, mais forte se torna seu laço divino de união, ou melhor, unicidade.
Anityam (não duradouro, efêmero); Asukham (sem prazer, sem alegria)[1]. O mundo exterior vive em nossa consciência terra-limitada. Essa consciência terra-limitada pode ser transformada na Consciência Eterna através de aspiração, devoção e entrega. A Consciência Eterna abriga alegria perpétua. A libertação deve ser alcançada aqui neste mundo. Qualquer homem de promessa irá alegremente assinar a destemida declaração de Emerson: “Outro mundo!? Não há outro mundo. Aqui, ou em lugar nenhum, é a questão integral.”
Quando olhamos para o mundo com nosso olho interior, o mundo é belo. Essa beleza é a reflexão da nossa própria divindade. Deus, o Belo, tem nosso coração aspiração como Seu Trono eterno. Nós, os buscadores do Supremo, nunca poderemos seguir no mesmo sentido que a orgulhosa filosofia de Nietzsche. Ele profere: “O mundo é belo, mas possui uma doença chamada de homem.” Pelo contrário. Podemos dizer em termos precisos que o mundo é belo porque ele foi iluminado por uma beleza superna chamada de Homem.
Anityam e Asukham não podem envenenar o coração de um verdadeiro buscador. Sua fé é casada com seu destino dourado. Ele canta e canta:
Meus dias eternos se vêem em um tempo que acelera;
Eu toco Sua Flauta de rapsódia.
Feitos impossíveis não mais impossíveis parecem;
Em algemas-nascimento agora reluz a Imortalidade.
– Sri Chinmoy, Immortality, My Flute, New York, 1972.
[1] * O autor aqui se refere ao verso 9.33 do Bhagavad Gita, onde ambas as palavras são usadas, e a segunda linha diz: “Você, que veio a este mundo transiente (anityam) e sem alegria (asukham), devote-se a Mim.”
Livro Bhagavad Gita – capítulo 8 – O Infinito Imperecível
Brahman é o Infinito Imperecível. Outro nome para Brahman é Aum. Aum é o Criador. Aum é a Criação. Aum está na Criação. O Aum está além da Criação.
Este capítulo começa com uma saraivada de perguntas muito significativas. Brahman, Adhyatma, Karma, Adhibhuta, Adhidaiva, Adhiyajña – o que são? O Senhor responde: “Brahman é o Absoluto Imperecível. Adhyatma é o auto-revelador Conhecimento da Natureza primeva de Brahman. Karma é o nascimento da atividade, normal e natural. Adhibhuta é a manifestação material perecível. Adhidhaiva é o conhecimento daqueles que são Reluzentes. Adhiyajña é o sacrifício que Eu faço para unir a manifestação de formas finitas com a Minha Vida infinita.” (8.3-4)
Krishna afirma que a auto-realização ou a realização da Imortalidade devem ser alcançadas durante a vida, no corpo, e em nenhum outro lugar. Assim como cada ser humano cria limitações, imperfeições e amarras, ele também é capaz de transcendê-las. Ele por fim entrará nos planos de Plenitude, Perfeição e Liberdade.
Nossa existência é o resultado de uma existência anterior. Este nosso mundo é o resultado de um mundo que existiu antes. Tudo evolui. A essência da evolução é um movimento interior e exterior. Esse movimento ou mudança acontece até mesmo no mundo de Brahma[1]. Mesmo após alcançar o mundo de Brahma, não há fuga das armadilhas do nascimento. Falando a verdade, nossos dias e noites terrenos nada são, senão um infinitesimal segundo, se comparados com os dias e noites de Brahma. Mil eras vivem num único dia de Brahma, e mil eras vivem em uma única noite de Brahma.
De nada adianta tomar refúgio em nossos dias e noites terrenos, pois são efêmeros. De nada adianta tomar refúgio nos dias e noites de Brahma, pois também eles não são eternos. Devemos e precisamos tomar refúgio apenas no Eterno Coração do Senhor Krishna, que é o nosso abrigo mais seguro, onde o dia não é necessário, e nem a noite, pois Seu coração é a Luz da Infinidade e a Vida da Eternidade. De nada mais precisamos, salvo a devoção. Nossa escolha suprema é a devoção. Nosso coração de devoção responde ao Seu Coração de Amor. Diz Ele: “Apenas a devoção invariável possui o direto e livre acesso à Minha Vida imortal, Minha Verdade absoluta.” (8.22)
O que está no interior cedo ou tarde se manifestará no exterior. O possuidor de pensamentos divinos também será o agente de ações divinas. Apenas para um homem dedicado e aspirante é possível pensar em Deus conscientemente enquanto estiver deixando o mundo terreno.
Krishna nos diz como um yogi entra no Derradeiro após deixar seu envoltório mortal. “Seus sentidos estão sob controle. Sua mente está colocada no coração, e ele medita em Mim. AUM ele canta devotadamente. Ele abandona o Prana, o alento-vida, e entra na realização última em Mim.” (8.12-13)
A madame H.P. Blavatsky, fundadora da Teosofia, mencionou Aum de uma maneira muito simples e significativa. Ela disse que “Aum significa boas ações, e não apenas um som dos lábios. Você deve dizê-lo em ações.” Para saber o que o Aum é e o que ele representa, é recomendado estudar os Upanishads que falam sobre Aum. O Mandukya Upanishad nos oferece o significado de Aum explicitamente.
O significado do Aum pode ser descoberto através de livros. Mas o conhecimento do Aum nunca pode ser obtido através do estudo dos livros. Ele deve ser conquistado vivendo-se uma vida interior, uma vida de aspiração, que transportará o aspirante aos níveis mais elevados de consciência. A maneira mais fácil e mais efetiva para subir alto, mais alto, altíssimo, é carregar-se de amor puro e devoção genuína. Dúvida, medo, frustração, limitação e imperfeição estão destinadas a se entregar ao amor devotado e à devoção entregue. O amor e a devoção têm o poder de possuir o mundo e serem possuídos pelo mundo. Ame a manifestação de Deus; você descobrirá que a criação cósmica é sua. Devote-se à causa da manifestação cósmica; você verá que ela o ama e o considera como parte de si.
É verdade que o conhecimento pode lhe trazer o que o amor e a devoção oferecem. Mas, muitas vezes, o conhecimento não é nutrido por amor à verdade, e sim pela satisfação dos desejos. É infrutífera a busca de conhecimento quando o desejo está por detrás dela. Quando o aspirante é todo amor e devoção, ele voa alto.
Durante o percurso de sua jornada, ele canta:
Não mais meu coração irá chorar ou se entristecer.
Meus dias e noites se dissolvem na própria Luz de Deus.
Acima da labuta da vida, minha alma
É um Pássaro de Fogo voando no Infinito.
Ao fim da sua jornada, ele canta:
Conheci o Uno e Seu Jogo secreto
E fui além do mar do Sonho-Ignorância.
Em ressonância com Ele, eu brinco e canto;
Possuo o Olho dourado do Supremo.
Ele agora se tornou sua própria Meta. Auto-amoroso, ele canta:
Profundamente embriagado com a Imortalidade,
Sou a raiz e os ramos de uma vastidão imensa.
Minha Forma eu conheci e realizei;
O Supremo e eu somos um – a tudo sobrevivemos.
– Sri Chinmoy, “Revelation”, My Flute, New York, 1972
[1] * O deus pessoal Brahma (masculino) não deve ser confundido com o Absoluto impessoal Brahma(n) (neutro). Por conta disso, muitos autores usam a palavra Brahma no nominativo e Brahman como forma-raiz (como Sri Chinmoy faz neste livro), pois dessa forma os dois nomes ou princípios são possíveis de distinção sem uma transliteração erudita exata.
Livro Bhagavad Gita – capítulo 7 – Conhecimento Iluminado
Em sua infinita Generosidade, Sri Krishna conta ao seu amado discípulo que ele lhe dará tudo o que tem e tudo o que é: Infinidade e Eternidade. Sri Krishna espera do discípulo apenas duas coisas em troca: Yoga e dependência. Podemos chamar essa dependência de entrega devotada, que é a unicidade indivisível do finito com o Infinito. Conhecer Sri Krishna é conhecer o Conhecimento Supremo. Realizar Sri Krishna é realizar a vida de tudo em essência.
Manushyanam sahasresu….
“Dentre milhares de homens, mal um se esforça pela perfeição espiritual, e dentre os que se esforçam e são bem sucedidos, mal um Me conhece em essência. (7.3)
Parece-nos que o terceiro verso joga água fria no buscador. Mas a intenção de Krishna não é nem um pouco parecida com isso. Krishna não apenas é todo Sabedoria, mas também todo Compaixão. Ele quer contar a Arjuna o que acontece de fato na maratona espiritual.
O Conhecimento supremo não é para aquele que possui curiosidade infantil, entusiasmo superficial, determinação fraca, devoção instável e entrega condicional. Qualquer uma dessas qualidades não divinas irá, sem falta, fazer o corredor interior fracassar.
O sexto e sétimo versos descrevem a relação que existe entre Sri Krishna e o universo. “Eu sou o princípio e o fim do universo. Sou a Fonte da criação e o local de dissolução. Além de Mim, nada existe. Tudo está entrelaçado em Mim, como pérolas num colar.” (7.6-7)
Quando nos concentramos em “Tudo está entrelaçado em Mim, como pérolas num colar,” imediatamente envisionamos o inigualável poeta Krishna.
São três as qualidades da natureza: sattva, rajas e tamas – harmonia, atividade e inatividade. Sri Krishna diz que essas três qualidades são Dele e estão Nele, mas Ele não está nelas.
Sattva é a principal das qualidades da natureza. Ela incorpora harmonia. Conheçamos a existência da harmonia em relação ao universo. Citemos Dryden:
Da harmonia, da harmonia Celestial
Esta Estrutura universal começou.
Da harmonia até a harmonia,
Por todo o compasso das notas, ela corre,
Com o diapasão soando pleno no Homem.
O possuidor da qualidade sáttvica tem certamente um coração de ouro. Ele sabe que sua vida possui uma significância própria. Seu alento é puro. Sua paciência, luminosa. Sua fortitude, inigualável. Sua certeza, infalível.
Rajas é a segunda qualidade. Um homem com a qualidade rájasica está sempre cheio de paixão dinâmica. Ele deseja possuir o mundo. Ele quer ser senhor do mundo. Ele praticamente não tem tempo para adentrar no mundo da iluminação interior. Sua vida acalenta apenas duas coisas: lutar e conquistar. Ele tem a possibilidade de se tornar um guerreiro divino ou ou guerreiro da completa falsidade. Ele possui a força para construir um templo da Verdade. Ele também tem a força para quebrá-lo e destrui-lo. Infelizmente, ele muitas vezes quebra e destrói o templo, por conta de sua visão sem luz e do elefante enlouquecido dentro de si.
Tamas é a terceira qualidade. É a preguiça, escuridão, ignorância, pecado e morte. Ela também é a desilusão mundana e a ilusão enganadora.
Sattva é a alma de visão clara.
Rajas é a vida frutífera ou infrutífera.
Tamas é a dança da morte.
Sattva se manifesta através da luz aspirante.
Rajas se manifesta através da força desejosa.
Tamas se manifesta através da noite escurecedora.
Um homem de virtude quer viver a verdade.
Um homem de ação deseja desfrutar do mundo.
Um homem de inatividade de nada desfruta. Pelo contrário, ele é desfrutado conscientemente pela escuridão, ignorância e morte.
Um homem de virtude possui uma amiga: a aspiração.
Um homem de atividade possui uma amiga: a inspiração.
Um homem de inatividade possui uma amiga: a ilusão.
Um homem de virtude tenta viver na verdade do presente, passado e futuro.
Um homem de ação quer viver no glorioso presente. Ele não dá muita atenção ao futuro.
Um homem de inatividade não vive no sentido direto da palavra. Ele dorme. Seus dias e noites são feitos de um sono sem luz.
O primeiro deseja se transcender devotadamente.
O segundo deseja se expandir forçosamente.
O terceiro se destrói inconscientemente.
Aqueles que trilham o caminho interior possuem quatro papéis distintos a realizar:
Arta, o deprimido, o aflito. A vida é uma cama de espinhos. Ele realizou essa verdade e clama pela transformação da vida. Ele deseja um leito de rosas. A dor é a sua dolorosa posse. Ele pode cantar com Francis Thomson:
Nada começa e nada termina
Que não seja pago com lamentos de dor;
Pois nascemos na dor dos outros
E perecemos nas nossas.
Jijñasu, o buscador, o investigador. O que ele busca é o conhecimento. O conhecimento nos diz porque um homem sofre, e mais. Já que o conhecimento incorpora poder, ele transforma o alento do sofrimento no alento do conhecimento vidente e instigador.
Artharthi, o buscador da riqueza verdadeira, a Verdade absoluta. Ele não possui tristeza. Ele não possui desejo terreno. Ele deseja viver na liberdade e libertação perpétua.
Jñani, o sábio. Aquele que é sábio conhece que o Supremo está em toda parte e que o Reino dos Céus está dentro de si. Ele vive no Supremo. Sua é a vida de unicidade com o Supremo. Seu é o mundo de verdadeira satisfação. Muitíssimo próxima é a intimidade entre ele e o Supremo.
Sri Krishna continua: “Nobres e bondosos todos eles são, mas eu considero o sábio, o iluminado, como minha alma escolhida e parte de Mim; somos completamente unos, absolutamente um. Quando a vida dele cumpriu o seu papel, quando a hora do silêncio bate à sua porta, Eu o coloco em Meu Coração, onde o Alento da Vida Eterna cresce.” (7.18-19)